LUAR DO SERTÃO (CATULO DA PAIXÃO E JOÃO PERNAMBUCO)

LUAR DO SERTÃO
Catulo da Paixão Cearense (1863/1946) e João Pernambuco (1883/1947)

Oh! Que saudades do luar da minha terra
lá na serra branquejando folhas secas pelo chão.
Este luar cá da cidade tão escuro
não tem aquela saudade do luar lá do sertão.
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
Se a lua nasce por detrás da verde mata
mais parece um sol de prata prateando a solidão.
E a gente pega na viola que ponteia,
e a canção é a lua cheia a nos nascer no coração!
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
Quando vermelha no sertão desponta a lua
dentro d'alma onde flutua também rubra nasce a dor!
E a lua sobe e o sangue muda em claridade
e a nossa dor muda em saudade branca... assim... da mesma cor.
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
Ai!... Quem me dera que eu morresse lá na serra
abraçado à minha terra e dormindo de uma vez!
Ser enterrado numa grota pequenina,
onde à tarde, a sururina chora a sua viuvez!
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
Diz uma trova, que o sertão todo conhece
que se, à noite, o céu floresce, nos encanta, e nos seduz,
é porque rouba dos sertões as flores belas,
com que faz essas estrelas lá do seu jardim de luz!!
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
Mas como é lindo ver, depois por entre o mato
deslizar calmo, o regato, transparente como um véu.
No leito azul das suas águas, murmurando,
ir por sua vez roubando as estrelas lá do céu!
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
A gente fria desta terra sem poesia
não se importa com esta lua nem faz caso do luar...
Enquanto a onça, lá na verde capoeira,
leva uma hora inteira, vendo a lua, a meditar!
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
Coisa mais bela neste mundo não existe
do que ouvir-se um galo triste no sertão, se faz luar.
Parece até que a alma da lua é que descanta,
escondida na garganta desse galo a soluçar!
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
Se Deus me ouvisse com amor e caridade,
me faria esta vontade o ideal do coração.
Era que a morte a descantar me surpreendesse
e eu morresse numa noite de luar no meu sertão!
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
E quando a lua surge em noites estreladas,
nessas noites enluaradas, em divina aparição,
Deus faz cantar o coração da Natureza,
para ver toda beleza do Luar do Maranhão.
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
Deus lá no céu, ouvindo um dia, essa harmonia,
a canção do meu sertão, do meu sertão primaveril,
disse aos arcanjos que era o Hino da Poesia,
e também a Ave-Maria da grandeza do Brasil.
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!
Pois só nas noites do sertão de lua plena,
quando a lua é uma açucena, é uma flor primaveril,
é que o Poeta, descantando a noite inteira,
vê, na Lua Brasileira, toda a alma do Brasil.
Não há, oh gente, oh! não
luar como esse do sertão!


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